sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Tratar a dor


Os planos de intervenção no caso do tratamento da dor incluem, geralmente, técnicas farmacológicas em combinação com estratégias psicológicas e outras.
Apesar de toda a panóplia de técnicas que podem ser utilizadas, as estratégias por si só não são suficientes, já que o mais importante é a atitude e confiança do sujeito acerca da intervenção que vai determinar a sua eficácia. Daí a importância de adaptarmos o plano de intervenção às características dos pacientes. Deste modo, o primeiro passo será informar os pacientes acerca dos resultados que podem esperar com a implementação de determinado tratamento.

Assim, devemos clarificar que, o objectivo da intervenção não é a redução da intensidade da dor per se (no caso das intervenções não farmacológicas), mas sim promover o desempenho de comportamentos que facilitam a recuperação, ensinar novos métodos para lidar com o desconforto, desfiguramento e, possivelmente, com a morte, manter o sentido de valor pessoal, restaurar as relações com os outros, reconceptualizar o significado da dor e, adquirir capacidade de controlo sobre esta.

Terapias farmacológicas
Os fármacos directamente utilizáveis em quadros de dor são os analgésicos. Estes podem dividir-se em três grandes grupos: não opiáceos, opiáceos e adjuvantes (fármacos que aliviam a dor em situações específicas, que controlam os efeitos secundários dos analgésicos ou que correspondam a medicação psicotrópica complementar). Os princípios que governam a utilização de analgésicos são:

Boca – a via oral é a privilegiada para os analgésicos incluindo os opióides fortes;

Relógio – os analgésicos são dados com regularidade e de forma profilática;

Escada – utilização da escada proposta pela Organização Mundial de Saúde. Se depois de se optimizar a dose de um fármaco este deixar de produzir analgesia, sobe-se para o degrau seguinte. Subjacente a este modelo de administração de fármacos está o conceito de “analgesia de largo espectro” – os fármacos de cada uma das três categorias analgésicas são usados adequadamente, isolados ou em associação, para maximizar o respectivo efeito.

Tratamento individualizado – a dose correcta é aquela que controla a dor. As doses devem ser gradualmente aumentadas até que a dor seja controlada ou, até que os efeitos secundários não justifiquem o aumento em escalada.

Terapias não farmacológicas
Em termos farmacológicos, por vezes, a dor é controlada através de antidepressivos e opióides, entre outros fármacos. Uma vez que a dor e a depressão co-existem frequentemente, a utilização de antidepressivos visa não só diminuir os sintomas associados à depressão, como também diminuir a dor, pois pensa-se que estes fármacos têm efeitos analgésicos ao actuarem nos substractos bioquímicos comuns às duas perturbações. No entanto, a utilização de antidepressivos, por si só, não ajuda a tratar a dor ou a depressão. Aliás, vários estudos demonstram que para o tratamento da depressão, a combinação entre psicoterapia e fármacos é mais eficaz, principalmente em casos de problemas complexos e elevado risco de recorrência, aumentando a eficácia da intervenção em 10-15%, comparativamente à utilização de medicamentos por si só. Também a utilização de opióides, por exemplo de morfina, acarreta vários efeitos secundários, tais como, depressão respiratória, náusea, sedação e obstipação que, se puderem ser evitados ou diminuídos, aumentam o bem-estar dos pacientes.

Ora, se existem outras formas de intervenção, nomeadamente psicológicas, que podem ser utilizadas nestes casos, prevenindo muitas destas complicações e aumentando a eficácia do tratamento [apenas 50% dos pacientes com dor crónica conseguem reduzi-la através de tratamentos puramente somáticos], porque não utilizá-las, principalmente se sabemos que a dor pode interferir no sono, apetite e na saúde em geral?

Controlo da dor - Modelo do portão


As doenças graves são acontecimentos ameaçadores e geralmente ambíguos (pela sua origem, desenvolvimento, tratamento, etc.), pelo que os pacientes terão de se basear em avaliações e interpretações subjectivas acerca da sua condição que, por sua vez, irão influenciar as respostas comportamentais e emocionais. Quando um paciente é diagnosticado com uma doença grave, como por exemplo cancro, ele irá estar mais sensível às alterações corporais e, guiado pela sua preocupação, observará o seu corpo à procura de novos sintomas, como é o caso da dor. Neste estado de constante vigilância da estimulação nociva e de preocupação, o limiar de tolerância à dor, por parte do paciente, será menor. Deste modo, podemos considerar a dor como um fenómeno subjectivo, cuja intensidade irá ser determinada por factores como, experiências anteriores, capacidade para compreender as causas e consequências da dor, assim como variáveis psicológicas, para além da estimulação sensorial (Quadro 2).

Melzack e Wall propuseram a teoria do portão, para a compreensão do fenómeno da dor, no qual salientam a importância dos factores psicológicos. Segundo estes autores a dor resulta da interacção entre componentes sensório-descriminativos (capacidade das vias da dor transmitirem informação temporal e espacial acerca de um estímulo nocivo), motivacional-afectivos (substrato de densas interconexões entre o sistema límbico e os sistemas moduladores da dor no cérebro) e cognitivo-avaliativos (torna-se aparente clinicamente pelas mudanças na dor que ocorrem quando o seu significado é alterado).

O “portão” estaria situado nos cornos dorsais da coluna vertebral que facilita ou inibe o fluxo de impulsos nervosos das fibras periféricas para o sistema nervoso central. Quando a quantidade de informação que passa através do portão excede um nível crítico, as áreas responsáveis pela experiência e resposta à dor são activadas. Pela acção do sistema nervoso central, o input somático vai ser modulado por factores cognitivos, afectivos e comportamentais, antes da dor ser percepcionada. Desta forma os factores psicológicos podem exacerbar (p.e. ansiedade) ou diminuir (p.e. capacidade de distracção) a experiência da dor.

A literatura demonstra que, enquanto a dor aguda se associa com estados de ansiedade, a dor crónica se relaciona com a depressão, provavelmente devido aos sentimentos de falta de controlo em relação à dor e ao desamparo aprendido. Por sua vez, os estados de depressão ou ansiedade podem exacerbar a dor experienciada, através dos mecanismos acima referidos.
É também de referir que nos pacientes em estado terminal, a dor pode ser exacerbada pelas dúvidas ou medos associados com a morte e o morrer. O aumento da intensidade da dor, por seu lado, desmoraliza ainda mais o paciente e a família que sentem que falharam nos seus cuidados.

Dor


Dor é uma experiência sensorial e emocional desagradável associada com lesões dos tecidos, potenciais ou reais, ou descritas em termos dessas lesões. A dor deixou de ser apenas um sintoma, para ser de facto um problema que aflige muitas pessoas com doenças crónicas, incapacitantes e/ou terminais. No entanto, uma morte sem dor, não é uma utopia. Nas situações de doença terminal, a dor pode ser consequência da doença, dos tratamentos e medicação, da debilitação provocada pela doença, mas também pode ser elicitada por factores psicológicos, tais como por exemplo, a angústia de querer expressar os seus sentimentos e não ter apoio para tal. Deste modo, deve-se distinguir entre “nocicepção” e “dor”. A nocicepção refere-se à informação sensorial capaz de ser percepcionada como dor. Por outro lado, a dor pode ser relatada mesmo na ausência de estimulação nociceptiva. A dor é um fenómeno somato-psíquico modulado pelo humor do paciente, pela moral do paciente e, pelo significado que a dor assume para o paciente.

Para além disso, existem vários tipos de dor, sendo a principal distinção entre dor aguda e dor crónica (Quadro 1).

1. Dor aguda – Este tipo de dor tem uma duração inferior a 6 meses (p.e. dor de dentes). Regra geral, este tipo de dor é sintomática, a doença que a origina é causada por agentes externos e é de curta duração e, o tratamento pode eliminar os sintomas e curar a doença subjacente. É este tipo de dor que se aproxima mais da noção de nocicepção.

2. Dor crónica, periódica – É um tipo de dor aguda mas intermitente (p.e. cefaleias). A dor crónica periódica distingue-se da dor aguda, pois tem de ter uma duração superior a 6 meses, mas também pelo facto de não ser necessária a existência de uma lesão orgânica subjacente.

3. Dor crónica, progressiva – Este tipo de dor está associada a doenças graves como é o caso do cancro, SIDA, etc. e, pode ser uma indicação de que a doença está a progredir (embora não seja sempre o caso, já que a dor é um fenómeno multi-factorial).

4. Dor induzida experimentalmente – Estimulação nociceptiva induzida em laboratório, através de, por exemplo, choques eléctricos, calor e frio.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Escala analgésica da OMS

Viver a vida no presente, como uma oferenda!!!

"Morre lentamente quem não viaja,
Quem não lê,
Quem não ouve música,
Quem destrói o seu amor-próprio,
Quem não se deixa ajudar.

Morre lentamente quem se transforma escravo do hábito,
Repetindo todos os dias o mesmo trajecto,
Quem não muda as marcas no supermercado,
não arrisca vestir uma cor nova,
não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente quem evita uma paixão,
Quem prefere O "preto no branco"
E os "pontos nos is" a um turbilhão de emoções indomáveis,
Justamente as que resgatam brilho nos olhos,
Sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho,
Quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho,
Quem não se permite,
Uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.

Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da Chuva incessante,
Desistindo de um projecto antes de iniciá-lo,
não perguntando sobre um assunto que desconhece
E não respondendo quando lhe indagam o que sabe.

Evitemos a morte em doses suaves,
Recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior do que o
Simples acto de respirar.
Estejamos vivos, então!»

Pablo Neruda

Para Ler e Ver...

  • Amara, Como cuidar dos nossos
  • Marie de Hennezel, Arte de Morrer
  • Marie de Hennezel, Diálogos com a Morte
  • Mitch Albom, As Terças com Morrie
  • Morrie Schwartz, Amar e viver: Lições de um mestre inesquecível
  • Tsering Paldrom, Helena Atkin e Isabel Neto, A dignidade e o sentido da vida: reflexões sobre a nossa existência